Ver uma pintura de Bosch é como aprender o deslumbramento. Por vezes sinto uma vaga inveja dos que vivem em Madrid mas resolvo a questão com uma ida ao Museu Nacional de Arte Antiga. Graças a Deus temos ali As Tentações de Santo Antão, a pintura que, seguramente, mais tempo de reflexão me ofereceu ao longo da vida.
Há quem diga que se trata da obra mais espectacular de Bosch mas O Jardim das Delícias não lhe fica atrás. Vi esse tríptico uma única vez durante não muitos minutos e tenho dele uma saudade imensa. Um dia terei de regressar a Madrid, a plantar-me na sala do "Jardim" durante o tempo suficiente que me permita algumas janelas de oportunidade para o olhar com sossego, sem muita gente a incomodar. Consigo fazer isso com facilidade no MNA, poderei fazê-lo no Prado?
Nem sempre consigo mas, por vezes, tenho lampejos de lucidez que me permitem aproximar vagamente de uma linguagem "boscheana" nos meus trabalhos. Muitas pessoas estabelecem uma relação directa entre muitos dos meus desenhos e o mestre, o que me surpreende pois eu próprio não veria essa relação se não me fosse apontada.
Quero criar um Jardim das Tentações mas duvido da minha capacidade de concentração. Como faria Bosch para pintar os seus mostrengos? Que estranho raciocínio, que inesperadas associações, que inventividade! A vantagem é que, em caso de falência imaginativa, posso sempre copiá-lo!
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