sexta-feira, outubro 15, 2021

O pedido

     Agora via como fora ridículo ao puxar o lustro aos galões por serem galões tão modestos; o latão não tem o esplendor brilhante da pepita de ouro. Imaginava o constrangimento do outro que, quando o olhou, parecia ter vontade de chorar - decerto não o imaginara  tão mesquinho nos sonhos, tão servil no momento de pedir - via-lhe agora nos olhos o choro a transformar-se em riso. Entre a compaixão e o gozo a distância de um momento.

    Arrependeu-se tanto de ter aberto em si aquela janela debruçada sobre o horizonte de quem é. Caíra-lhe o céu, ficou-lhe a sombra. Pediu ao chão que se lhe abrisse debaixo dos pés mas o chão, indiferente, permaneceu. Há coisas que nunca mudam. Quando nascemos no meio do estrume dificilmente nos habituaremos às discretas nuances do perfume.

     Não sabia se havia de chorar, gargalhar ou fugir dali para fora. Ficou o silêncio, especado no soalho que brilhava como louco batido pelo sol do meio-dia.

    

1 comentário:

Maria Marques disse...
Este comentário foi removido pelo autor.