quarta-feira, março 27, 2019

Poeira

Tenho tanta saudade de milhentas coisas que esqueci que nem me apercebo do que sofro por isso. Bem que tomo apontamentos (ando sempre com um caderninho daqueles enfiado no bolso e caneta acompanhante), releio escritos antigos, experimento inventar menemónicas complicadíssimas que, como seria de esperar, esqueço no momento seguinte.

Não consigo manter o passado actualizado, constato que a sua relação com o presente é de tal modo misteriosa que nem parecem membros da mesma família.

Mais uma vez tenho esta sensação: o momento que vivemos é como uma nuvem de poeira que levantamos no caminho, uma nuvem que transporta ainda um pouco dos passos anteriores e já nos vai envolvendo com algo semelhante ao terreno que viremos a pisar. Não existe diferença significativa entre o que foi, o que é e o que será, é tudo tempo.

Isto pareceu-me simples mas sei que, daqui a nada já terei esquecido a razão porque me pareceu tão claro, tão evidente, tão esplêndido. No meio da poeirada perco-me todos os dias e, todos os dias, me volto a encontrar.


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