Tinha saudade do tempo em que as coisas eram como Deus quis que elas fossem. O tempo em que aquela senhora correria atrás do seu nariz, o tempo dos passarinhos cantando nos ninhos enquanto ele desceria a rua que desagua no Tejo; e a rua não cheiraria tanto a mijo. Havia de cheirar a mijo, mas menos, porque era um tempo em que as coisas eram como Deus quis que elas fossem.
Se Deus quisesse que as ruas tresandassem a mijo daquela maneira talvez vivêssemos uma idade sempre média.
No chão da praça espalhavam-se restos do passado e pairava um discreto cheiro a mijo adocicando a atmosfera. Um grupo de vadios grisalhos focava toda a sua atenção numa coisa qualquer que um deles segurava à altura dos narizes.
Na esplanada sentava-se um filho da puta perfumado de cuja existência já se havia esquecido. Lembrava-se bem de ser aquilo um autêntico cabrão, apesar das camisinhas e dos sapatinhos de vela, mas falhava-lhe o nome.
"Não preciso de me lembrar do nome daquele monte de merda" pensou "basta-me saber a porcaria que ele é". E cuspiu no chão. O desprezo que sentia abriu-lhe um pequeno orifício no peito da alma. Cheirava a mijo pra caralho!
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