quarta-feira, dezembro 09, 2020

Do auroque ao santo de pau carunchoso (3.º episódio)

(no episódio anterior) A relação entre a nossa imaginação e a nossa capacidade plástica corporizou-se na criação de objectos sagrados ao ponto de precisarmos de construir espaços artificiais que servissem de habitação às representações das divindades. Imagino que tenha sido mais ou menos assim que surgiu a ideia do Templo. A escultura, com a sua tridimensionalidade, revelou-se a técnica mais capaz de revelar as formas divinas.

Adorar um pedaço de madeira ou um calhau transformados em figuras significativas é atitude que implica uma fé imensa. Temos milénios de treino e prática da imaginação para lá chegarmos, olhar um boneco e ver um deus! O esforço necessário para realizar tal transferência de poderes entre o dinamismo universal e objectos inanimados é feito digno de nota, não está ao alcance de qualquer macaco. É um acto de magia.

Curiosamente, os mágicos mais importantes desta história até nem são aqueles que criam os bonecos (os artistas/artesãos), os mágicos mais importantes são aqueles que criam as narrativas em volta dos bonecos (os sacerdotes/shamãs). Seja como for é espantoso todo o poder acumulado em redor de algumas destas figuras.

O boneco adorado é uma materialização do conceito que encerra, uma transposição de energia vinda directamente do cosmos para a nossa mesinha-de-cabeceira, parece-me fascinante. Uma oração ao boneco antes de ir para a cama e depois do chichi, eis uma actividade muito praticada por esse mundo fora.

Nos tempos que correm, nos países onde existe liberdade religiosa, isto não é nada de mais. Mas nem sempre foi assim. Por estranho que possa parecer a adoração da bonecada foi motivo para lutas intestinas e muito boa gente bateu a caçoleta à conta de perspectivas diferentes em relação ao assunto.

(continua)

2 comentários:

sousa disse...

-- É a pura das realidades, mas, é preciso ver que;
as pessoas no geral, precisam de ter uma bengala para se manterem de pé.
Além disso precisam de ver, tocar e falar com algo...
Falar para fora, quando Ele está em cada um de nós independentemente da sua religião,
Ele não nos fez sozinhos, deixou em cada um de nós o Espírito Santo e,
cada pessoa fala com pode ou acha que é a melhor forma, (desde que não mate, nem mande matar).
As pessoas que têm a melhor religião do Mundo, (é essa mesmo) aquela em que ela acredita é a correta! Cada e todo individuo acredita na sua religião (com ou sem Cristo ou o menino Jesus) é um ato de Fé, sem dúvida, apenas escolhem a melhor forma de sentirem-se bem falado com Deus através de jesus Cristo.
-- Além disso, todos podem criticar outros, por rezarem assim ou de outra forma! Há sempre uma crítica, basta querer. Mas, não há uma sugestão para ser de outra forma um pouco melhor! (Será que seria melhor?) Cada um fala com o seu Deus como pode, como se sente melhor e, como sente que está a ser ouvida por Ele !!!

Silvares disse...

Absolutamente de acordo. Se Deus existe Ele é absolutamente livre! E se nós fomos por Ele criados acredito que a Liberdade seja o nosso destino.