Não se ouvia grande coisa: ruídos esparsos, pequena barulheira indefinida, uma espécie de marulhar urbano. Conhecendo o lugar onde ficava a praia sabia bem que aqueles sons não poderiam nunca ser um eco da voz potente de Poseidon, alguma coisa seriam, só que não o mar, o mar não, isso com toda a certeza.
Nem sequer apurou o ouvido, nada daquela coisa meio suja poderia alguma vez vir a interessá-lo. No entanto sentia dentro de si palavras que se deslocavam em conjunto, palavras que formavam frases e pareciam produzir algo semelhante a música; música estranhamente sincopada, animada por ritmos desconexos mas nem por isso menos agradáveis.
Apercebeu-se de que algo estaria para acontecer; que tudo aquilo: os sons, as palavras mudas, a estranha sensação que dentro dele se formava, tudo aquilo fazia parte de um todo monstruoso, uma dilúvio, um vulcão, uma avalanche que estaria quase, quase a acontecer. Deixou-se estar, mais absorto do que atento, mais morto do que vivo, deixou-se estar assim, tão quieto, tão descansado que até mesmo o deserto dele teve inveja.
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