domingo, outubro 15, 2017

Declaração de amor

A acusação do malfadado Processo Marquês vem fazendo sonhar muitos cidadãos portugueses. Iremos andar embrulhados em questões processuais que, decerto, irão dourar muita pílula, entravar muita investigação e desviar atenções.

Iremos assistir a condenações em praça pública e a juras de amor à presunção de inocência; enfim: vamos assistir a uma sucessão de trambolhões magníficos e espectaculares para gáudio da populaça e exibição de extraordinários dotes jurídicos dos causídicos envolvidos no drama que se segue.

Os abutres aguardam, poisados num ramo seco de uma árvore morta.

É por estas a por outras que tenho um particular apreço pela Geringonça. O Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda nunca fizeram parte do malfadado "arco da governação", essa espécie de qualidade misteriosa que enformaria uma elite capaz de governar a nação portuguesa e que, quem não tinha percebido percebe agora, não era mais que uma associação de malfeitores, os vampiros da canção de Zeca Afonso.

Com a Geringoça a guardar o portão da quinta, a bicharada malcheirosa fica a rosnar do lado de fora. Um ou outro, mais atrevido, ladra alto e bom som, mas a coisa fica mais difícil para os monstros glutões que devoram a nossa riqueza comum. A imbecilidade de um Cavaco ou a sonsice de um qualquer Coelho já não fazem grande mossa.

Apesar de todas as suas incongruências e evidentes deficiências físicas, amo a Geringonça. Espero que se mantenha durante muitos e bons anos mas já se adivinha a impaciência dos adeptos do "centrão". Com Rui Rio a chegar-se ao cadeirão do PPD vai-se sentindo muito esfregar de manápula  e um certo pivete ansioso começa a sentir-se outra vez.

Tenhamos o bom senso necessário para evitar que os abutres desçam, de novo, em vôo picado sobre a carcaça agonizante do nosso país. Eles andam por aí!

2 comentários:

rui sousa disse...

Deixa-me lá ser um bocado ingénuo, livre de clichés e de ideias feitas: porque é que um Rui Rio e outros que tais não se podem candidatar a governar o país por acharem que têm ideias melhores para governar? Porque é que é assim tão difícil reconhecer que quem pensa diferente de nós também o pode fazer porque acredita verdadeiramente no que pensa? Porque é que quem não é de esquerda é obrigatoriamente candidato a abutre e quem é de esquerda é sempre uma espécie de Madre Teresa de Calcutá? Quando é que nunca houve criminosos de esquerda nem corruptos de esquerda? Porque é que a esquerda não perde essa superioridade e arrogância moral? Porque é que um crime feito por alguém da esquerda é sempre menos grave que um crime da direita? Será que eu sou o único que gosta mais de viver num mundo com erros e defeitos do que num mundo perfeito vigiado e julgado por uma sociedade moralista. Eu também gosto da Geringonça mas se a Geringonça um dia deixar de governar foi porque os portugueses assim o decidiram, e isso para mim é o ar que respiro. E se a esquerda nunca fez parte do arco da governação foi porque os portugueses não quiseram. Custa assim tanto viver em democracia?

Silvares disse...

Tens toda a razão. Mas, a verdade, é que o "arco da governação" foi sempre uma espécie de associação de malfeitores que governou mais em proveito próprio do que em proveito do desenvolvimento do país e da nossa Democracia. Não nego que a esquerda tenha corrupção a correr-lhe nas veias (há vários exemplos na governação autárquica), o PS tem sido responsável por muitos dos referidos malefícios,mas, até agora, os partidos chmados de "esquerda radical" não tinham tido influência prática na governação após o PREC. As maiorias absolutas e de conveniência nunca foram devidamente escrutinadas na Assembleia da República. Agora parece ser. Claro que se o povo quer, o povo tem. E quis Cavaco. Teve Cavaco. E quis Sócrates. Teve Sócrates. A Democracia tem funcionado de 4 em 4 anos. Agora parece-me funcionar um bocadinho melhor, em ritmo de Geringonça.