segunda-feira, junho 30, 2008

Uma foto

Esta foto de Sérgio Azenha apareceu aqui há uns dias no jornal Público. O 1º ministro parece olhar para o horizonte. Por trás um poster completa a mensagem. Podemos ver, meio desfocado, Tom Cruise em Missão Impossível III. Sócrates, o nosso Tom Cruise, olhando para um horizonte virtual, empenhado em cumprir a missão de fazer de Portugal um farol que ilumine a perigosa costa da Europa. Vai Sócrates, dá-lhe com força!

sábado, junho 28, 2008

'El Coloso' del Prado no lo pintó Goya

GOYA
Asensio Juliá, "El pescadoret" (Hacia 1798).

Óleo sobre lienzo. 56 x 42 cm.
Inscripciones: Inscripción, ángulo inferior izquierdo: "Goya a su amigo Asensi".
Colección Thyssen Bornemisza (Lugano, Suiza).


Pronto, é oficial, a verdade hoje é um pouco diferente daquilo que era anteontem. Os peritos espanhóis declararam em definitivo que 'El Coloso' del Prado no lo pintó Goya. Esta historieta é exemplar.

Atente-se no seguinte parágrafo (vai em espanhol que se lê com a mesma fluência que se fosse em português): "Manuela Mena, jefa de Conservación de Pintura del siglo XVIII y de Goya, aludió hoy a cuestiones "estilísticas" para constatar que la obra "se aleja de Goya completamente". Argumentó así la existencia de "pinceladas dudosas", "incoherencias luminosas", "falta de precisión" y "trazos no acabados" para desvincularla del pintor aragonés. "En mi opinión, el cuadro es de otra mano a la de Goya", manifestó." Não é espantoso? Agora que se sabe que não é de Goya apontam-se erros e defeitos técnicos de palmatória na execução da obra. "Incoerências luminosas" e "pinceladas duvidosas (?)" é muito bom. As coisas que as pessoas conseguem dizer quando falam de pintura!

Após a descoberta das iniciais de Asensio Juliá algures na zona inferior esquerda da pintura, recorrendo a raios X, os "expertos" do Museu do Prado finalmente confirmaram uma suspeita que traziam a roer-lhes a alma desde 1991, segundo rezam as crónicas. "O Colosso" foi pintado pelo discípulo, não pelo mestre.

Curiosamente (ou talvez não) o reconhecimento da autoria de "O Colosso" faz nascer um interesse renovado sobre a figura, até aqui obscura e olimpicamente ignorada, de Asensio. Certamente irá haver uma busca mais cuidada de obras por ele realizadas, uma catalogação mais rigorosa de algumas pinturas atribuídas a Goya e teremos motivos para celebrarmos um "novo" artista espanhol.

É fixe, acho eu, que Asensio renasça assim, saindo finalmente das sombras negras do esquecimento. O simples facto de Goya o considerar um amigo (segundo a inscrição no retrato que pintou do seu discípulo e que ilustra este post) faz dele um novo herói no meu (extenso) catálogo de heróis.

quarta-feira, junho 25, 2008

Viva a Pintura!



Uma historinha exemplar para desanuviar o ambiente em, pelo menos, umas noventa das cem cabeças.

Li hoje no jornal que "O Colosso", uma das obras-primas atribuídas ao meu mais que adorado Goya (tenho por este mestre uma admiração que ultrapassa tudo o que possa dizer ou escrever) afinal pode não ter sido pintado por ele (ver também aqui).

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Pronto, querem lá ver! Então como é? Tudo o que se disse, tudo o que se escreveu sobre a terrível visão do Surdo sobre os malefícios da guerra e a forma aterradora como ela arrasa a esperança do Ser Humano tem, afinal, menos esta parcela?
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A tela é excelente. Ter sido pintada por Goya ou por Asensio Juliá (aqui retratado pelo Mestre), um seu colaborador ocasional, faz dela menos do que aquilo que é?
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Outra questão interessante que se levanta tem a ver com a dimensão da crítica na construção da imagem do artista. Ser conhecido ou reconhecido nos textos que ficam para a posteridade é importante. Quantos artistas excelentes aguardam na penumbra da sombra projectada pela fama dos considerados grandes mestres por uma migalhinha de reconhecimento? Quantos nomes e obras grandiosas vão ficando para trás, caídos e esquecidos nos quadros cronológicos dos manuais de História da Arte?
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Enfim, Goya não sofre a mínima beliscadura. Que o Colosso tenha sido pintado por ele ou por Asensio Juliá não é mais que um pormenor. O que temos a fazer é olhar para a obra e reflectir sobre ela independentemente de quem a tenha realizado. Viva a Pintura!

terça-feira, junho 24, 2008

Pessimista do caraças!

Giacomo Balla, Pessimismo e Optimismo (não sei a data mas sei que é coisa de Futurista italiano...)


Olhei para os posts anteriores e fiquei um pouco incomodado comigo próprio. São posts amargos, com uma conversa afiadinha, tipo alfinete, a espetar, a dar alfinetadas por tudo e por nada. São posts que pretendem ser bem-humorados mas que, na verdade, são azedos como leite não-pasteurizado e com um sentido de humor, por vezes, duvidoso.

Estarei a ficar velho e rezingão? A precisar de arejar a corneta? Um pouco de optimismo não me faria mal nenhum... ou faria? Caraças, lá estou eu a voltar ao mesmo.

A duvidar.

A duvidar sempre da possibilidade de que as coisas possam correr bem, convencido de que há sempre uma muito maior probabilidade de as coisas correrem pior do que sou capaz de imaginar.

Tristongo, cabeça baixa, careca derrotada, apercebo-me de que sou um gajo muito pessimista. Estou frito porque assim hei-de ser triste como uma noite sem lua e sem estrelas, uma noite só toda de escuridão e mais nada. Triste. Mais triste não deve haver.

Será por ter nascido Capricórnio e me terem dito que o meu ascendente é igualmente Capricórnio? Duplamente Capricórnio deve ser coisa bera, a solicitar dúvidas duras como rocha e sorrisos levados pela mais discreta das brisas.

Que fazer então? Como poderei ser optimista? Deve haver comprimidos para combater a coisa ou, pelo contrário, comprimidos que avivem a outra.


(suspiro)


Mas, espera lá, ó coisinho! Porque carga de água hei-de querer ser optimista? Haverá algum mal irreparável no meu dulcíssimo pessimismo? Estou cá a matutar no problema e não vejo qual seja o mal de ver sempre o lado menos brilhante da questão. Ser optimista é coisa de ovelha quando põe olho no carneiro.

Pronto aí, amigos meus, retiro o que disse e afirmo o contrário, de modo a que tudo fique como se este post não tivesse chegado ao 100 Cabeças. Só o deixo aí para marcar posição. Eu sou um pessimista do caraças!

Haaaaa, como sabe bem...


Fado


Agora que o futebol nos deixou meio zonzos, sem sabermos quem apoiar no Euro 2008, vem o Eurobarómetro revelar que somos o povo mais pessimista dos 27 que compõem a União Europeia.

Não confiamos no Futuro da mesma forma que desconfiamos do Passado. O Português sente-se como salsicha lambusada em mostarda e metida num cachorro-quente para algum estranja comer, numa tarde de fastio.

Desconfiamos das possibilidades de emprego, não acreditamos que a situação económica vá melhorar e choramos como Madalenas arrependidas aos primeiros acordes de Ó Povo da Minha Terra, largados pela fadista-máxima dos tempos que correm, essa estrondosa Mariza, que Deus a guarde.

Estamos tão em baixo, com a moral tão rôta, que só nos apetece fingir que somos espanhóis ou marroquinos ou o que quer que seja. Nem o Cristiano Ronaldo foi capaz de nos levantar a coisa!

O mais estranho da sondagem que nos revela agora esta face suja e escurecida no espelho da opinião pública é que, há um ano atrás, o pessoal andava bem mais entusiasmado com as possibilidades de vir a ter uma vidinha com menos faduncho , mais luminosa e, até, satisfatória. Os dados são esclarecedores: não sonhávamos sequer com a merda que agora nos borra as botas!

Somos assim, a dar um bocadinho para o histérico. Ora andamos eufóricos com quase nada, ora caímos em depressão profunda por coisa nenhuma. Luas!

Se não tivéssemos perdido aquele jogo com a Alemanha por 3-2 como seria? Vai na volta acreditávamos que o desemprego estaria a modos que a diminuir.

E se chegássemos à final? Seríamos capazes de jurar que o nosso Pequeno Sócrates é um estadista de elição que nos vais tirar do buraco.

E se tivessemos sido campeões da Europa? Não sei. Talvez a Nossa Senhora voltasse a aparecer por aí para nos dar os parabéns e aproveitar a oportunidade de ter boa publicidade.

Mas não. Nada! Perdemos. Ainda por cima com os alemães, que devem estar bem melhor classificados do que nós até nessa coisa do Optimismo/Pessimismo da União. Esse gajos têm tudo para ser felizes. Até loiros são. E altos e com olhos azuis! Nós népias. Morenotes, baixitos e de olho escuro. Nada a fazer que não seja aceitar este fado.

segunda-feira, junho 23, 2008

Ser uma página


Há homens (e decerto mulheres) cujo máximo desejo é serem um dia uma página de um livro de História. Olhando o nosso pequeno Sócrates percebemos isso. Ouvindo os seus desabafos percebemos como é vácuo e falho de substância, como se fosse um corpo de carne e osso cheio de palha nos lugares onde deveriam estar os órgãos mais significativos para o Ser Humano. Sócrates está preenchido de ambição. O que já não é pouco para um homem como ele (pode até ser demais!).


Tudo o que Sócrates faz, todas as suas acções, os discursos, as manigâncias várias que vai tecendo para se manter no poleiro do papagaio máximo e, principalmente, o modo pouco envergonhado como manipula a informação por forma a distorcer factos e a ajeitar a realidade à medida do seu sonho, tudo isso é reflexo deste desejo quase infantil de que um dia as criancinhas, na escola primária, iniciem o dia com um hino de louvor ao Grande Timoneiro que um dia colocou a Nação nos eixos e nos salvou das garras da Coisa Má (assim mesmo, indefinida e pouco visível, uma monstruosidade que só os que a combatem podem ver e a compreendem).

Sócrates rejubila quando discursa perante os seus pares europeus e enegrece até à mais escura raiva quando tem de se haver com os políticos autóctones. A uns faz vénias aos outros pontapearia no cú com a maior das volúpias caso isso não fosse algo que uma personagem histórica dos tempos modernos não pode fazer. É que Sócrates ficará nas História como sendo um dos "bons", um combatente do "mal", uma espécie de Messias. Talvez um dia, dentro de muitos séculos, Sócrates possa ser canonizado, tornar-se Santo de uma qualquer seita de origem cristã, talvez ele possa vir a ser o símbolo da regenaração da alma humana emergindo do caos para salvar os nossos descendentes da perdição total.
Sócrates tem pinta de um Nemo da trilogia de Matrix, um misto de homem de acção, iluminado por uma força sobrehumana e de bestialidade cósmica, impregnado de bondade e limpidez. Tem tudo para um dia cumprir o seu máximo ideal e transformar-se numa página de um livro de História. Nem que seja apenas uma nota de rodapé em letras pequeninas.

sexta-feira, junho 20, 2008

Seis perguntas, respostas zero


Se aqueles que nos governam são corruptos e não conseguem ultrapassar as limitações próprias dos indigentes, porque os escolhemos nós para nos governarem?

Se aqueles que nos governam prometem uma coisa quando candidatos e fazem outra logo que governantes, como sereias esfomeadas, porque não os corremos nós dos lugares que afinal desmerecem?

Se aqueles que nos governam fazem obstinadamente o trabalho sujo de outros que não se sujeitam a sufrágio porque o seu poder é de outra natureza e lhes confere uma força infinita, a força do dinheiro, porque insistimos em manter este estado de coisas?

Se o governo não governa para o povo mas sim para aqueles que exploram o povo porque continuamos a designar o nosso modelo político como "democracia"?

Se não vivemos em Democracia, afinal de contas vivemos "em" quê?

Será que, afinal, o povo não tem outra utilidade que não seja validar o poder daqueles que o roubam e exploram a sua força de trabalho, votando sazonalmente, como ovelhas enfileiradas para a tosquia, em sinal de reverência quase religiosa a uma deusa ausente, essa Democracia de que todos falamos e na qual acreditamos mas que, afinal, na realidade, nunca vimos em lado nenhum?

quarta-feira, junho 18, 2008

Milagre!


É extraordinário! De um ano para o outro, as nossas criancinhas viram a Luz! Os resultados das provas de aferição para os mais minorquinhas em Matemática e Português (mas sobretudo as provas de Matemática) registaram uma melhoria espectacular.


Tudo fica a dever-se ao excelente desempenho da equipa ministerial encabeçada por esse génio desengarrafado que é Maria de Lurdes Rodrigues que, num ano apenas, conseguiram implementar uma série de medidas no terreno cujos resultados foram, como se pode constatar, instantâneos.


O Plano Nacional de Leitura e o Plano de Acção para a Matemática são absolutamente geniais. O secretário Valter Lemos merece aplausos e o seu congénere Pedreira bem pode ser agraciado com uma comenda qualquer. A Ministra que tenha, pelo menos, uma estátua erigida na Avenida 5 de Outubro para que possamos rumar todos os anos por esta altura com coroas de flores e hinos de louvor entoados com vozes embargadas pela profunda emoção que será olhar a face desta senhora eternizada no bronze (pelo menos). Conseguiram num ano apenas aquilo que os burros dos seus antecessores não haviam sequer vislumbrado ser possível.


Podemos recuperar a confiança no futuro. Com esta equipa no Ministério da Educação o dia de amanhã decerto cantará. Portugal verá nascer uma geração de Einsteins e Luíses de Camões com dois olhos atentos aos pormenores que o mundo oferece à mais profunda das poesias.


Sinceramente: estou comovido. Sinto-me abençoado por Deus quando olho para as pautas e observo as folhas de estatística com as percentagens de saltinhos em frente dados pelas nossas criancinhas do ano que passou para este. Lindo! Obrigado Maria!!!

domingo, junho 15, 2008

Profeta

A regra é: obedecer


E pronto, aí está. Se dúvidas pudessem existir elas estão esclarecidas: a democracia na União Europeia é uma mentira. Os irlandeses ao votarem "não" no referendo ao Tratado de Lisboa criaram um problema que fez saír o monstro da toca onde se esconde com um enorme rabalhão de fora. Aqueles que realmente mandam na Europa dos 27, alemães e franceses são os mais peitudos, avisam os duendes irlandeses que serão excomungados da União caso não resolvam dizer que, afinal, estão de acordo com os termos do malfadado tratado. Eles que se amanhem, a Europa sonhada pelos sonâmbulos que assombram os gabinetes de Bruxelas não pode ser posta em causa e muito menos pode ser travada no seu caminho para a Grande Luz.


O que importa afinal de contas? Uma grande comunidade que se rege por leis democráticas ou, pelo contrário, uma grande comunidade que se rege pelas leis do mercado? Talve fosse tempo de rebaptizar esta imensa Europa como CEE, Comunidade Económica Europeia, substituindo o Parlamento Europeu por uma imensa Assembleia de Accionistas. Quem paga as contas e detém as acções impõe as regras por forma a garantir retorno do investimento realizado.


Cada vez mais vai ganhando substância o pensamento que advoga a necessidade de o Estado desinvestir nos campos do chamado funcionalismo público. Diz muita gente que a salvação está no investimento privado nas áreas da Educação, da Saúde, na garantia das reformas, etc. Que o Estado deverá, num futuro próximo, apostar apenas na manutenção das forças de segurança, as polícias, nas forças armadas, os exércitos e, cereja no topo do bolo, continuar a untar as mãos ao poder judicial. Assim os nossos impostos seriam utilizados na manutenção das forças que garantem a manutenção e aplicação das leis e regras de convivência sociais, nada mais. O resto seria negócio puro e duro. Esta perspectiva é algo aterradora e prefigura a imagem do Estado policial. Num mundo assim organizado não há Concertação Social, não há poder reivindicativo, passa a haver uma única regra à qual os cidadãos/consumidores devem prestar atenção, a regra é: OBEDECER! Um pouco como, imagino eu, acontece na China actual. Trabalhar até morrer para garantir que os lucros dos grandes patrões se mantenham em crescimento sustentado.


O totalitarismo está de malas feitas para a sua viagem de regresso. E nós, como vamos recebê-lo quando ele chegar, enorme e arrogante? Com a mão estendida, é evidente. Mas estendida numa saudação ou com um cacete bem apertado no punho e pronto a arriar-lhe uma valente traulitada no meio da tromba?

sábado, junho 14, 2008

Vampirismo


A Democracia é um modelo político cada vez mais incómodo. Em Atenas os cidadãos participavam activamente da governação da sua cidade. Tinham o dever cívico de opinar e participar da discussão, quem não o fizesse seria considerado um cidadão pouco interessante, por assim dizer.


Ao adoptarmos este modelo político para as nossas modernas sociedades mediáticas, estamos a entrar num jogo algo perigoso. Primeiro, o universo de cidadania é imenso e difícil de abarcar pelo cidadão comum. Segundo, o cidadão é, cada vez mais, um consumidor e olha a sua vida por uma perspectiva mais pragmática e menos altruísta. Quero ter direito a consumir mesmo que isso signifique perder alguma capacidade de intervenção na "coisa pública". Traduzindo: quero que se lixe a República. Este sentimento (ou será uma atitude) prolifera como um vírus.


Se a Democracia, tal como imaginamos que foi na sua génese, é difícil de praticar a nível nacional, torna-se pouco mais do que uma miragem quando transportada para uma dimensão mais alargada, como é o caso da União Europeia. A participação dos cidadãos é mais um incómodo do que uma ajuda na construção de um conjunto de regras que uniformize um território com a dimensão da "nossa" Europa.


A derrota do Tratado de Lisboa é mais um sintoma de doença do que propriamente uma prova de vitalidade democrática. Isto porque, numa votação deste género, os irlandeses acabaram a optar pelo "sim" ou pelo "não" muito mais em função da situação política local do que interessados ou elucidados sobre as consequências do seu acto ao nível do que chamamos "A construção europeia". Um dos argumentos dos vitoriosos do "não" para justificar a sua posição em relação ao Tratado de Lisboa era que, em caso de vitória do "sim", haveria uma inevitável legalização do aborto na hiper-católica Irlanda. Não só se tratava de um argumento falacioso como também mostra a dimensão do debate de ideias que realmente influenciou a votação dos cidadãos.


Nos países onde a ratificação do Tratado é enviada para o Parlamento (os restantes 26, se não estou em erro) há uma outra dimensão de análise. Os deputados de cada um dos parlamentos nacionais decerto votam em função das orientações partidárias, por um lado, ou baseados num cálculo de possibilidades de eles próprios virem a ser "eurorratas", numa perspectiva mais funcional e egocêntrica (muito mais do que eurocêntrica).


Num ou outro caso, seja a decisão tomada pelos parlamentaresou deixada a votação popular, o que é verdade é que o "debate" está sempre inquinado. Não há grandeza nem olhares para lá do horizonte, a mesquinhez, o interesse particular ou a pequena vingança acabam por ditar a orientação das grandes decisões. Mas a Democracia contemporânea é assim mesmo, mais imperfeita que um cagalhão pisado por uma bota cardada. A alternativa é entregarmos as decisões a um ou dois tiranos eleitos por nós para fazerem esse papel.


Curiosamente a Tirania foi um modelo de governação utilizado na Grécia antiga em alternativa ao poder Democrático sempre que uma grande crise parecia pedir um iluminado que tomasse as decisões que a maioria não seria capaz de impor. E não foi só na Grécia que a Tirania foi utilizada conscientemente e com o aplauso das populações. Talvez haja uma certa simpatia pelo Tirano, uma espécie de Pai da nação. Lembremos Salazar, Staline ou Hitler, isto para citar exemplos mais acabados e fáceis de identificar.


Anda por aí muita tirania encapotada ou, mais descaradamente, travestida de Democracia. O que é um facto é que o Capitalismo parece estar a atingir um ponto limite na sua capacidade nos iludir com uma idade de "vinho e rosas". A maquilhagem começa a ser incapaz de esconder a verdadeira face dos que nos governam para lá dos parlamentos, sejam eles nacionais ou transnacionais, os tais "vampiros" que nos cantou Zeca Afonso numa célebre canção.


Parece-me que estamos a assistir à queda do Capitalismo enquanto paradigma social saído da Guerra Fria. O Comunismo faliu e caíu. O Capitalismo segue-lhe as pisadas. Resta saber o que vem aí. Para já todos percebemos que estamos entregues a um bando de Vampiros. Não vislumbro alternativa que não signifique uma nova Idade Média. Uma Idade entre a Revolução Industrial e aquilo que se lhe seguirá. Para já fala-se em Era Pós-Industrial. O que nos reservará o futuro? A única certeza que tenho é que não caberá a Deus decidir por nós.

sexta-feira, junho 13, 2008

Acontecimento




O Acontecimento é o mais recente filme de Night Shyamalan. Filme de terror em tons mais ou menos suaves, parece-me não ser tão eficaz em termos cinematográficos quanto alguns dos anteriores títulos de Shyamalan. O problema deste realizador é que ele colocou a fasquia muito alta para si próprio. Depois de Sexto Sentido ou Unbreakable (como é o título em Português?)cada novo filme de Shyamalan foi sendo comparado com os seus antecessores e se em Sinais a coisa se manteve sem problemas, com A Vila as vozes dissonantes começaram a fazer-se ouvir para se tornarem incomodativas após A Senhora na Água.

Entre a crítica portuga Shyamalan parece ter caído um pouco em desgraça e, pelo menos no Público, fartam-se de lhe dar porrada por tudo e por nada. Já se sabe que a crítica vale o que vale, que os críticos vivem ansiosos por descobrirem a "next big thing", fazendo previsões dignas dos bruxos mais encartados. Depois, quando criticam os seus favoritos, preocupam-se em encontrar provas que justifiquem e validem as suas previsões, mostrando a um mundo ingrato e ignorante a sua genialidade e capacidade de projecção no futuro. Além de um indiscutível bom gosto. Shyamalan é agora considerado produto de menor qualidade o que, em certa medida, posso compreender. Alguns críticos de cinema gostam mais de si próprios do que de cinema.


Resumindo, O Acontecimento é um filme escorreito, que conta uma história de forma clara e objectiva. Um objecto cinematográfico bastante razoável. Em relação a anteriores produções de Shyamalan falta-lhe "aquele" momento genial e abusa um pouco (na minha óptica) de cenas "gore" (porque é que temos de ver tudo na cena do cortador de relva?). Fico com a sensação de que Shyamalan pretende provar qualquer coisa aos que o criticam e menorizam. Nesse esforço é o cinema que sai a perder. Este filme é bom mas há ali qualquer coisa que está a emperrar um pouco a máquina Shyamalan. Esperemos que essa "qualquer coisa" se resolva depressa para podermos assistir ao regresso em grande de Night Shyamalan. Um homem não pode ser sempre genial, caraças!

quarta-feira, junho 11, 2008

Cristalzinho quebradiço


Ao que parece está a chegar ao fim a paralisação dos transportadores rodoviários. É com algum alívio que a notícia vai chegando após mais uma vitória da selecção nacional de futebol por terras suiças. A coisa estava a tornar-se verdadeiramente complicada.

Esta foi uma estranha "greve" (foi uma greve?) uma vez que, tanto quanto percebi, os patrões foram os principais promotores do protesto , por muito que pretendam demarcar-se de tudo o que se passou, e os sindicatos estiveram sempre reticentes em relação à forma de luta adoptada.

Mas o que retiro de toda esta cégada é a fragilidade do nosso sistema de organização, o nosso modo de vida é mais frágil que um cálice de cristal. Bastaram dois dias de paralisação para que se tenha instalado um tensão quase insuportável com tudo o que compõe a base do nosso sistema de distribuição e consumo de bens de primeira necessidade a entrar em colapso imediato.

Esta situação vem mostrar como em situação de verdadeira crise energética a Europa vai pelo cano em menos que um esfregar de olhos. Se por qualquer razão houver uma quebra significatva na distribuição de combustíveis o caos surge de rompante e tudo vai submergir sem apelo nem agravo.

Está na hora de começarmos a imaginar seriamente um mundo sem petróleo (e os biocombustíveis parecem ser mais uma parte do problema do que um esboço de solução)

Mas temos de fazê-lo com a urgência das questões que deviam ter sido resolvidas anteontem.

terça-feira, junho 10, 2008

Vá-se esconder, Sr. Presidente!


“Hoje eu tenho que sublinhar, acima de tudo, a raça, o dia da raça, o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas”, declarou [Cavaco Silva], citado pela Lusa, numa insólita confusão entre a designação actual e a que era adoptada pelo anterior regime.
Este mesmo Presidente que anda por aí a lamentar a ignorância da juventude em relação a acontecimentos da nossa história nacional mais recente, atira esta calhoada sem que lhe trema a voz. Soma-se nova pérola a um colarzinho jeitoso de tropeções que o nosso Presidente vai dando na mais triste ignorância. Mas não será de todo culpado, coitado do homenzinho, uma vez que, quem fala verdade não merece castigo. Ao proclamar a sua vontade de sublinhar o "dia da raça", Cavaco mostra a sua verdadeira face a quem a não consegue ver. Ele é um presidente pouco culto, pouco sagaz e muito pouco capaz de compreender o mundo que o rodeia. É para isso que tem assessores, para lhe explicarem o que se passa com os seres humanos que vivem para lá dos balanços económicos e das contas de sumir do orçamento de estado.
Pode é ter maus assessores, o que torna ainda mais penosa e complicada a sua existência presidencial, um dos maiores equívocos do nosso regime democrático.
A propósito desta pérola cavaquista recomendo um salto a este post, no Acercadanet.

sábado, junho 07, 2008

Não conto lá voltar tão depressa





O Rock in Rio é uma daquelas coisas que vale a pena experimentar. Há camisas que dizem "Rock in Rio, eu vou", ontem vi muitas que, apesar de estarmos lá dentro, diziam "Rock in Rio, eu fui" (talvez pudessem dizer, eu estou aqui:-) antecipando já o dia depois. O dia da ressaca.
Uma feira imensa, cheia de gente a andar de um lado para o outro, a levantar poeira, como na canção da senhora Sangallo, onde há demasiadas coisas a fazerem barulho ao mesmo tempo. Por exemplo, é um tanto desagradável assistir ao excelente concerto dos Clã (no palco mais pequenino) com o "unx, unx, unx" da pista de dança a fazer de tapete ao som da banda da incendiária Manuela Azevedo (esta mulher é uma força da natureza!).
Muito Rock na sessão de ontem. Mais Rock do que o habitual naquela espécie de rio de gente com margens de lago e que, por isso, corre perdido, sem ter onde ir que não seja ali mesmo. Um rio que escorre para dentro de si próprio. Deixemo-nos de esquisitices: ontem foi uma sessão especial do festival. Os Muse são qualquer coisa de absolutamente extrordinário, os OffSpring põem o rolo compressor em funcionamento e vão por ali fora, os Linkin Park (os mais estranhos e obscuros dos 3) acabaram por soar de forma algo agressiva aos meus ouvidos. Após uma boa mão-cheia de horas de concertos e confusão, nem outra coisa seria de esperar. Mas é sempre mágico assistir à comunhão dos espectadores uns com os outros e todos com a banda no palco, cantando a plenos pulmões cada hit logo a partir do 2º ou 3º acorde. Arrepiante.
Apesar de tudo, não conto lá voltar tão depressa. Será necessário algo de muito (mas mesmo muito) especial para me levar a meter os patins de regresso ao Rock in Rio. É que, por altura da próxima edição, a minha filha já poderá ir sozinha e não vai precisar do conforto de saber que, no meio daqueles milhares aparentemente infinitos, estão duas personagens que são os pais, para o que der e vier.
Não deu e não veio. O ambiente é surpreendentemente pacífico. É nítidamente uma festa o que para ali vai. Uma celebração pagã, festejando todos aqueles deuses e semi-deuses do panteão da cultura Pop do novo século.
Estar ali (sóbrio) dá que pensar.

(o vídeo aí em cima é de uma actuação ao vivo dos Muse, algures e nem sei quando. Tem um som mesmo mau (a voz mal se entende)e dá uma imagem pálida daquilo que foi a portentosa exibição de talento na noite de ontem. Pálida até porque as imagens deste vídeo foram captadas sob a luz do dia e todos sabemos como a noite é capaz de fazer brilhar as estrelas! Há mais uns quantos vídeos no menu deste, melhorzinhos. Se tiveres pachorra e gostares de Rock'n'Roll do melhor, explora a coisa porque vale bem a pena.)

quarta-feira, junho 04, 2008

Sindicalismo

Não me lembro de ver os sindicatos com um olhar tão vesgo como os vejo agora. Sou sindicalizado na FENPROF vai para uma carrada de anos, tantos quantos tenho de professor. Até hoje fiz dezenas de greves, mesmo em situações nas quais discordava das razões apontadas pelos dirigentes do meu sindicato. Por uma razão de solidariedade laboral (e social e política...) não gosto de me ver ao espelho com cara de "amarelo" fura-greves. Mas, no caso concreto do meu sindicato, há razões de sobra para protestar além das que se prendem com os salários ou a progressão na carreira. Faria de bom grado uma greve por tempo inderteminado até conseguir condições de trabalho dignas tendo em vista a melhoria da qualidade do ensino nas escolas públicas. Menos alunos por turma, melhores equipamentos (adequados ao mundo tecnológico) etc e tal. Mas não. Insistimos em barafustar apenas por razões que não colhem na opinião pública. Só nos mexemos quando nos metem a patorra no bolso. A imagem pública degrada-se, os que são prejudicados pelas nossas acções reivindicativas pensam que apenas nos movemos em função do vil metal. Será um facto? Eu próprio tenho as minhas dúvidas mas não é isso que me fará entregar o cartão que guardo na carteira com orgulho indisfarçado.
O movimento sindical enfraquece a cada dia que passa. O trabalho precário, os "recibos verdes", a falta de perspectivas de carreira laboral afastam os trabalhadores dos sindicatos. Os patrões reclamam mais poder para nos darem uns valentes pontapés no cú e os partidos do "arco do poder" no nosso país fazem o jogo deles. Estamos feitos ao bife!
A comunicação social contribui fortemente para esta imagem progressivamente negativa, retocando sem pudor a informação que veicula. Estaremos a assistir ao canto do cisne dos sindicatos, tal como estamos habituados a conhecê-los? É bem possível. E depois? Depois será um longo e inóspito deserto que teremos de atravessar com os abutres a sobrevoarem, vigilantes, a nossa difícil caminhada.
Será necessário repensar o movimento sindical, despartidarizá-lo e encontrar-lhe um novo rumo para as lutas que com eles travamos. Isso ou a morte anunciada. Para gáudio de neoliberais e outras aves tão pouco raras quanto eles.

terça-feira, junho 03, 2008

...


... traz-me todo o silêncio que encontrares e pendura-o nessa parede.

segunda-feira, junho 02, 2008

É qualquer coisa

É estranho, complicado, difícil de explicar. É qualquer coisa, impossível dizer que coisa. As imagens, repetidas até à exaustão, da multidão de emigrantes que aguardava a chegada dos nosso queridos matraquilhos da selecção nacional em terras suiças deixa qualquer um de cabeça à roda.
Ele era no aeroporto, na estrada onde rolava o autocarro da selecção e, finalmente, nas ruas de Neuchâtel. Dezenas, centenas, milhares de pessoas vestidas com as camisolas vermelhas da equipa de futebol de Portugal, aguardavam o efémero momento da passagem do veículo para explodirem numa gritaria eufórica, histérica, mesmo. E depois, aliviados, sorriam, parecendo confusos com a sua própria reacção, zonzos de uma emoção impossível de verbalizar. Aquilo que vai lá dentro parece poder expressar-se apenas com os tais gritos e aquele esbracejar frenético. Portugal, Portugal, Portugal. Uma espécie de alegria, ao que parece.
São portugueses e isso revela-se naquela fé estranha. Umas vezes na Nossa Senhora de Fátima, outras no Cristiano Ronaldo, são parte deste povo que espera ainda o regresso do Desejado. Somos parte deste povo que não sabe fazer um país de forma organizada, que não se compreende a si próprio nem ao mundo que o rodeia. Este povo capaz apenas de ter fé. Uma fé cega e doentia, uma coisa inexplicável. Uma sensação terrível que cresce dentro do peito e só pode saír numa gritaria descontrolada, a sensação de ser português e pertencer a este povo meio esquecido no fim do Velho Mundo.
Sinceramente, tanta maluquice, tanta tolice, comove-me até às lágrimas. Ver e ouvir aqueles emigrantes com os seus sotaques variados, a língua atrapalhada pela convivência com outras línguas estrangeiras. Gente tão simples que até dá dó. E a mi dá-me dó porque sou igualmente simples, igualmente maluco e igualmete tolo. Sou um deles e eles são como eu.
Eu sei que os jogadores são isto e aquilo. Que o futebol etc. Eu sei que isto é irracional e destemperado. Sei perfeitamente. Mas gosto. E sinto aquela coisa cá dentro. E tenhovontade de gritar. Só o não faço por pudor e porque seria estranho desatar aos gritos para um écrã de TV.
Mas no próximo Sábado não me perdoo. Vou estar a roer as unhas, assistindo ao jogo com a Turquia e só quero que Portugal ganhe, nem que seja com um golo marcado com os tomates por um defesa adversário. Vou certamente chorar, seja qual for o resultado. E porquê? Sei lá porquê!É qualquer coisa!

domingo, junho 01, 2008

Histeria sonhadora


Eu até sou um fã de futebol. A Selecção Nacional faz-me sentar em frente à TV nem que jogue contra o Merdiquistão e, apesar de não ter posto uma bandeirola no estendal quando foi o Euro cá na nossa terra, fico sempre emocionado quando aqueles palermóides dos nossos jogadores cantam o hino nacional nos momentos que antecedem o jogo. Sentimentalismo...

Mas o que se está a passar com a dita selecção nestes dias que antecedem o início do presente europeu é demasiado. Que seca!

Os jogadores são tratados como algo que não são (não sei o quê, apenas sei que ninguém merece ser tratado desta forma). Há programas que nos mostram a forma como se sentam na sanita, como apertam a camisa ou gostam de passar as tardes em que não fazem nada. Os telejornais abrem todos com imagens em directo que mostram o povo aos pinotes e aos gritos, à beira da histeria por... nada!

Esta tarde o presidente da República recebeu os matraquilhos e a "cerimónia" (sem o mínimo interesse) passou em directo e em simultâneo nos 3 canais ditos generalistas. O discurso de Cavaco lá saíu, rouco e sem brilho, em dia internacional da criança e não se fala de outra coisa. O resto do mundo deixou de ter interesse. O governo respira de alívio e até Manuel Pinho se sente mais à vontade para as suas tiradas que lhe valeram o título de maior pedaço-de-asno do mês de Maio.

Tudo gira à volta dos chamados Viriatos, os nossos meninos, os craques, os maiores do mundo! Desta vez bastaria que fossem os maiores da Europa mas, com tanta barulheira e histeria e desespero em volta dos catraios, tenho cá a impressão que quando for preciso jogar a sério eles vão sentir mais vontade de chorar que de pontapear a chincha.

Os pescadores algarvios desfilam com bandeiras negras, há marchas contra a fome, o país vai desabando devagarinho mas, o que importa tudo isso comparado com os jogadores de futebol a estrearem os fatinhos novos e a entrarem no autocarro e a saírem do autocarro e a entrarem no avião e,momento alto, o avião a descolar rumo à Suiça?

Lá vão eles. Os nossos sonhos. Por cá fica a dura realidade. À espera...